Uma das minhas maiores dificuldades de exercitação do meu buda interior foi o pato, uma das preparações de maior complexidade em relação ao tempo de preparo.

Após criar uma confiança com o "cappo carrasco" fui direcionado para a preparação do main course, o prato principal e logo de cara fui prepar o danado do pato no inicio do cruzeiro. Começava na noite anterior indo na butcher, setor dos açougues em especifico no "fish preparation", preparação dos frutos do mar e aves do navio, lá solicitava os box de patos destinados ao cozimento, normalmente era liberado 200 destes animais. Depois de encher o troller com os box's subia o elevador e levava direto a minha praça, lá colocava em "placas", assadeiras, de dez em dez em ordem e utilizava dois fornos combinados em temperatura média de 150 a 170 ºC com tempo de 55 min, esse processo variava de acordo com o tamanho do animal e tudo feito após o fim do serviço do jantar e da limpeza da estação por volta das 11:30 da noite. Terminado esse processo o forno desligava sozinho no tempo determinado e íamos para nosso descanso e os patos ficavam no forno esfriando em temperatura ambiente até a manhã seguinte. Esse processo todo fazia com um Filipino e um Indiano que compadecia do trabalho que tinha, pois o cappo depois da primeira vez que mostrou o processo nunca mais deu as caras para olhar o executado.
Na manhã seguinte o meu Bom dia já era dado pelos colegas como forma de zoação. A principio olhava o animal e ficava perdido, mas me ensinaram os cortes e a melhor forma de segurar o bicho, técnicas que me deixou craque no corte, retirava todo o excesso do líquido gorduroso que ficava nas placas(em grande quantidade) e começava a trabalhar, esse processo durava a manhã toda, cerca de 4 horas destinadas aos danados. Era cortado em quatro partes de forma simétricas e depois removia 1/4 do nosso aparente. Nesse meio termo o cappo fazia o fundo com as ossadas e mais no inicio da noite o molho de laranja e adicionado ao pato finalizado a cocção e direcionado para a linha de montagem.
Tudo se tornou mais prático depois de um tempo apesar de odiar essa preparação e depois da mudança de praça tudo ficou pior. Já numa praça nova, Roast station, com tudo novo, continuei fazendo o mesmo processo porem com a ajuda de outros colegas, o que me deixou mas tranquilo e menos sobrecarregado, mas como nada a bordo são flores tivemos troca de cappo de novo na estação, chegava para assumir o cargo um Filipino que deu muita dor de cabeça. Era do tipo de profissional "baba ovo" ou pior, inseguro no que fazia, tudo ia com uma amostra para uma aprovação do chef, não é que isso seja desnecessário, mas o cara fazia isso em cada etapa de cocção.

No caso dos patos ele fazia um processo bem diferente, colocava em baixa temperatura e tempo continuo para o cozimento a noite toda, mas isso não era legal, o bicho não ficava no ponto certo para o corte e por muitas vezes ficava cru e o pior quente o que dificultava o corte e demorava muito mais tempo mesmo tendo 4 pessoas fazendo essa produção e o lembro que da primeira vez começamos 8h da manhã e só terminamos as 16h porque o retardado colocou para o corte o bicho cru e ainda inventou de cortar cada pedaço de peito em 3 e coxa em 2 deixando uma estética duvidosa perante a apresentação. Falei que esse processo era errado de acordo como eu tinha aprendido anteriormente com o "cappo carrasco" e ouvia que eu era um simples terceiro cozinheiro e tinha que realizar o que ele mandava. A cada facada que dava só pensava no pescoço daquele PH filho da puta, mas graças a Deus o colega conseguiu convence-lo que estava errado e o fdp me escutou, mas nada estava vencido, tinha que tirar da cabeça dele a história de cortar em partes e de deixar de enrolar a placa com plastico filme, isso mesmo plástico filme, isso só deixava o bicho mais duro que ele já era e totalmente ressecado. Resumindo um retardado.

Deixamos de começar às 8 e iniciávamos às 6;45, acordava às 6 e isso me incomodava mas terminávamos mais cedo e conseguia descer em Bari para dá um rolé. Estava mas tranquilo quanto a isso mas a criatura inventava arte toda semana, só pra matar de raiva, porem Deus é maravilhoso e o contrato do cidadão terminou e minha felicidade reinou. Os dias de pato se tornaram mas práticos e já com novo cappo consegui visitar Santorini, uma cidade que até então não tinha visitado, lógico que começava mais cedo a produção, porém feliz! Uma produção de 4 horas passou para 8h e depois para 2:30, pense na brata resumida quando estamos feliz com o que fazemos.
O pato tinha como guarnição purê de batata gratinada, repolho roxo refogado no molho de maça e bastonetes de cenoura, molho de laranja e decoração com laranja caramelada.